Conheça a história da Aida Celtic: academia de futebol localizada no campo de refugiados em Belém, cidade palestina na Cisjordânia

Em 17 de agosto de 2016, o Celtic FC recebeu a equipe israelense do Hapoel Beer-Sheva, em uma partida de qualificação para a UEFA Champions League (Liga dos Campeões da Europa) da temporada seguinte. Algumas semanas antes, quando os dois clubes haviam sido sorteados para o confronto, a polêmica em torno da partida teve início.

Historicamente, o Celtic Football Club, da escócia, tem uma torcida conhecida por seus posicionamentos políticos e, juntamente com uma forte identidade irlandesa, é comum ver nas arquibancadas, demonstrações de solidariedade à Palestina, por exemplo.

Dois anos antes (2014), o clube já havia sido multado pela UEFA, pois seus torcedores tinham exibido bandeiras palestinas no jogo contra o KR Reykjavik, da Islândia. Com uma equipe israelense prestes a jogar em Glasgow, cidade mais populosa da Escócia com 581,900 habitantes, aproximadamente, muito se falou sobre possíveis manifestações de apoio à Palestina por parte dos torcedores do Celtic.

 

Torcedores do Celtic com bandeiras da Palestina no jogo contra o Hapoel Beer-Sheva

Torcedores do Celtic com bandeiras da Palestina no jogo contra o Hapoel Beer-Sheva

 

Sendo um clube com mais de 130 anos de existência e muitas glórias no futebol, não é surpresa que os torcedores do Celtic valorizem e promovam manisfestações solidárias aos povos em conflito. Seu grupo de “ultras”, o Green Brigade, talvez seja o melhor exemplo disso.

Com um histórico de apoio à causa Palestina, desde simples faixas nas arquibancadas até projetos mais ambiciosos, os torcedores do Celtic estabeleceram relações com a região no Oriente Medio, principalmente no Campo de Refugiados de Aida, em Bethlehem (Belém), cidade palestina localizada na parte central da Cisjordânia.

Vale ressaltar que os próprios palestinos na Cisjordânia já exibiram também faixas de solidariedade ao Green Brigade em relação às suas lutas internas, evidenciando uma relação de respeito mútuo entre ambos.

 

Palestinos na Cisjordânia exibem faixas de agradecimento ao Celtic

Palestinos na Cisjordânia exibem faixas de agradecimento ao Celtic

 

Palestinos na Cisjordânia exibem faixas de agradecimento ao Celtic

Palestinos na Cisjordânia exibem faixas de agradecimento ao Celtic

 

Palestinos na Cisjordânia exibem faixas de agradecimento à Green Brigade

Palestinos na Cisjordânia exibem faixas de agradecimento à Green Brigade

 

Palestinos na Cisjordânia exibem faixas de agradecimento à Green Brigade

Palestinos na Cisjordânia exibem faixas de agradecimento à Green Brigade

 

Retornando à partida classificatória para a Liga dos Campeões da Europa, nos dias que antecederam o jogo entre Celtic FC e Hapoel Be’er Sheva FC, houve uma repercussão moderada por parte da mídia, influenciada inclusive, pela UEFA, clube, “Police Scotland” e até mesmo, por alguns torcedores do Celtic, que prefeririam manchetes esportivas às questões políticas.

Apesar disso, no dia da partida, o Green Brigade não deixou de cobrir sua seção nas arquibancadas com bandeiras de apoio à Palestina. Embora essa imagem tenha sido icônica, o que se seguiu foi o que mais revelou o apoio do Celtic e de toda a campanha global em solidariedade a causa Palestina.

Conforme alertado pela entidade, o clube escocês foi punido pela UEFA, em decorrência das ações de seus torcedores, resultando em uma multa de £8.600 (USD 10,450 ou R$ 52.630).

Mesmo assim, o Green Brigade lançou a campanha #MatchTheFineForPalestine (“cubra o valor da multa para a Palestina”), com a esperança de fazer exatamente o que a hashtag declarava. A campanha rapidamente se tornou global, com doações chegando de apoiadores do mundo inteiro, à medida que a história ganhava exposição. Enquanto o objetivo inicial era superado, isto é, cobrir a multa aplicada pela UEFA, novas metas eram estabelecidas e ultrapassadas, rapidamente.

Da Faixa de Gaza à Cisjordânia, os palestinos mostravam seu apoio e gratidão pela campanha: fotografias de crianças e voluntários médicos exibindo a hashtag da campanha surgiam aos montes. Mensagens em video do Campo de Refugiados de Aida foram transmitidas e uma equipe de futebol de Gaza posou ao lado de uma faixa que dizia: “Obrigado, Celtic… com amor de Gaza”, enquanto se preparava para uma partida.

Em meio à ampla utilização de camisas do Celtic, bandeiras e faixas improvisadas pelos moradores locais, um grande escudo do Celtic foi projetado na lateral de um prédio, na Cisjordânia.

Foram ações como essas que estabeleceram as bases para um legado que perdurou além da própria campanha.

 

Escudo da Aida Celtic inserido na camisa icônica do Celtic FC

Escudo da Aida Celtic inserido na camisa icônica do Celtic FC

 

No final, um total de £176.076 (USD 213,979 ou R$ 1.077.696) foi arrecadado e dividido entre dois beneficiários: a Medical Aid for Palestine – MAP, uma instituição de caridade britânica que fornece ajuda médica imediata para aqueles em situação crítica, ao mesmo tempo em que desenvolve capacidades locais e habilidades para garantir o desenvolvimento a longo prazo do sistema de saúde palestino, e o Lajee Center, do Campo de Refugiados de Aida, um centro criativo e cultural de base que trabalha com as novas gerações de palestinos à medida que continuam sua luta contínua por justiça e direitos para a Palestina e todo o seu povo.

 

Logos da Medical Aid for Palestine e Lajee Center

Logos da Medical Aid for Palestine e Lajee Center

 

É importante destacar que este último já tinha uma relação com o Green Brigade, que antecedia esses eventos e, de forma mais significativa, forneceu uma base para construição da campanha.

Embora o dinheiro arrecadado tenha feito, e continue a fazer, a diferença para o futuro das novas gerações de palestinos, outros planos foram traçados na época para consolidar um vínculo mais forte e duradouro entre os envolvidos.

Em 2019, foi lançada oficialmente a Aida Celtic, uma Academia de futebol que representava o Campo de Refugiados de Aida. Gerenciada localmente pelo Lajee Center e apoiada internacionalmente pelo Green Brigade, tinha como metas alcançar níveis semelhantes de apoio e generosidade, concedidos à campanha #MatchTheFineForPalestine, que estabeleceu as bases para sua formação.

Desde sua criação, a rede de apoio para a academia e as estratégias para reavivar o entusiasmo que cercou a campanha iniciada em agosto de 2016, foram fundamentais para o sucesso da Aida Celtic.

A exposição criada em torno da criação da Aida Celtic promoveu a conscientização sobre a situação dos palestinos e incentivou o florescimento de relacionamentos e possíveis aberturas para o diálogo, entre e sobre os dois estados: Palestina e Israel. Várias figuras famosas contribuíram para a campanha, desde então, como o cantor Roger Waters, um dos fundadores do Pink Floyd, que exibiu a icônica bandeira da Palestina em um dos seus shows ao vivo, durante sua turnê em 2016, para uma audiência global.

Outra figura de grande importância foi o ex-jogador e lenda do futebol, Eric Cantona, que posou com a camisa da Aida Celtic e publicou a foto em suas redes sociais. Cantona, como sua esposa, Rachida Brakni, são conhecidos também por suas lutas e solidariedades com a questão palestina.

 

Cantona e Roger Waters em defesa da Palestina

Cantona e Roger Waters em defesa da Palestina

 

Todavia, seria ingênuo por parte daqueles que fazem a gestão da Aida Celtic, esperar o mesmo apoio financeiro de marcas e fornecedores esportivos. Por isso, a parceria com a popular distribuidora de moda, “A Number of Names” tornou-se vital. A marca Anon pode não ser um nome conhecido por grande parte dos torcedores mundiais, mas está bem estabelecida no mercado e abraçou uma causa de grande importância para todos os povos, não somente os palestinos.

Enquanto alguns podem questionar o motivo dessa parceria, os mais perspicazes reconhecem que a Aida Celtic possui reais condições de gerar receitas suficientes para honrar seus compromissos, além de fornecer kits de qualidade para suas equipes na academia, uma vez que sua icônica camisa listrada em verde e branco (em alusão e homenagem ao Celtic FC), foi lançada com grande repercussão mundial, onde todos os lucros serão destinados para a Aida Celtic.

Por enquanto, os objetivos da Academia são simples e modestos: proporcionar aos jovens jogadores de futebol, refugiados palestinos, um ambiente saudável, seguro e totalmente equipado e estruturado.

Com orientação correta e apoio internacional, espera-se que a Aida Celtic floresça a partir do seu humilde começo, assim como aconteceu com o clube escocês, parceiro que empresta o seu nome e identidade.

 

Equipe da Aida Celtic: orgulho e gratidão pela oportunidade de jogar bola

Equipe da Aida Celtic: orgulho e gratidão pela oportunidade de jogar bola

 

O marca Celtic é universal, o uniforme é icônico, sua história é valorizada e seus torcedores/apoiadores são diferenciados. Além do lastro significativo aqui, o Celtic oferece uma estrutura robusta e comprometida com a causa palestina, proporcionando mais uma história de sucesso em sua trajetória, dentro e fora dos gramados.

É uma crença universal que o futebol pode quebrar barreiras e trazer esperança para todos. Espera-se que a Aida Celtic, que se encontra diante de um muro de separação ilegal, seja o próximo exemplo disso.

 

Artigo publicado originalmente no site da Aida Celtic

• Foto de capa: Agência Reuters

 

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• Medical Aid for Palestinians:

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A Ajuda Médica aos Palestinianos (MAP) trabalha em parceria com as comunidades palestinianas para defender os seus direitos à saúde e à dignidade, através do desenvolvimento de serviços de saúde eficazes, sustentáveis ​​e liderados localmente, da prestação de ajuda médica durante emergências e de campanhas para derrubar as barreiras à saúde e aos cuidados de saúde palestinos, hoje e no futuro.

Visão: um futuro em que todos os palestinianos possam aceder a um sistema de cuidados de saúde eficaz, sustentável e liderado localmente e à plena realização dos seus direitos à saúde e à dignidade.

Missão: trabalhar pela saúde e dignidade dos palestinos que vivem sob ocupação e como refugiados.

Objetivo: a plena realização do potencial de saúde e bem-estar dos palestinianos, apoiado por um sistema de saúde sustentável, de alta qualidade, facilmente acessível e gerido localmente.

 

• Lajee Center:

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O Lajee Center (Centro Refugiados) é uma organização independente e não governamental da sociedade civil palestina, com sede no Campo de Refugiados de Aida/Belém. A visão, missão, programas e relações do Centro para Refugiados derivam da sua identidade palestina, da luta pela justiça e igualdade e dos princípios dos direitos humanos, com base nos quais o trabalho é conduzido no Centro para promover os direitos individuais e coletivos. do povo palestino.

O trabalho do Lajee Center visa desenvolver as capacidades e competências dos jovens refugiados nos campos cultural, educacional, artístico e social, proporcionando um ambiente melhor, proporcionando capacidades que facilitem ao grupo-alvo realçar as suas capacidades e talentos e desenvolver os seus competências e criando a atmosfera e as condições adequadas para permitir que a geração emergente de refugiados palestinianos exerça os seus direitos e defenda todos os direitos do povo palestiniano.

 

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Adriano Ávila

A prova inquestionável que existe vida inteligente fora da Terra é que eles nunca tentaram contato com a gente.

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