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Recentemente, assisti a um comercial de smartphone integrado à AI (inteligência artificial, em inglês). Nele, aparece um homem no mais caricato estilo “gênio da lâmpada da Faria Limer”, e diz para uma mulher que ela teria direito a três desejos. Então, ela responde: “quero falar vários idiomas, desenhar vestidos e saber qualquer coisa em segundos”.

Todos os desejos são prontamente atendidos. Porém, ela vai continuar sem saber nada a respeito do que desejou. Soma-se ao cenário nada inteligente proposto pela marca, a conotação machista presente no comercial. Essa falsa sensação de saber, talvez seja o menor dos problemas em torno da AI.

Como nas midias digitais (outrora, redes sociais), a inteligência artificial “cria” cenários de deslumbramento, esperança e praticidade, além de entregar soluções fáceis para todos os problemas da sociedade, quando na realidade, promove ainda mais, a distância entre milionários e cidadãos comuns em nosso único planeta, pois a riqueza gerada a partir dessa tecnologia dificilmente será distribuída de forma sustentável e os novos empregos não serão, nem de perto, suficientes para o atuais em iminência de extinção.

Geração de renda e meio ambiente continuarão sendo os temas mais importantes no Século XXI. Lembre-se disso quando for votar. Políticos que não priorizarem essas pautas só enfatizarão suas inaptidões para os cargos almejados.

 

Conteúdos autorais

 

Um usuário nas midias digitais, faz poucos dias, me perguntou como seu sabia que as ilustrações dos troféus tinham sido feitas por mim. Tal situação surgiu porque, pela enésima vez, grandes empresas do setor de esportes usaram conteúdos do FUTBOX, do qual sou o fundador, para publicações em seus perfis, sem a nossa autorização. Resumindo: ganhando dinheiro com o trabalho dos outros. E não foi por falta de empenho do Futbox ou tentativas de contatos para que pudéssemos, por exemplo, iniciar uma parceria comercial. (Dois exemplos para ilustrar a falta de ética profissional de marcas estabelecidas no mercado: 1 e 2).

Sobre essa pergunta em relação às ilustrações dos troféus, que foi mais uma dúvida da nossa autoria do que curiosidade em conhecer o fato, ela possui algumas camadas. A mais preocupante é a total incapacidade de saber fazer algo, onde o próprio ato de fazer já é o sificiente para saber que foi feito por você.

Me lembrou, inclusive, a animação Kung Fu Panda, onde as personagens buscavam o “Pergaminho do Dragão” com todos os segredos e conhecimentos sobre a vida, mas era apenas um pedaço de papel dourado, sem nada escrito, refletindo o rosto de quem o encontrasse. Uma linda mensagem em contraponto à tela de um smartphone. A série “Black Mirror” retratou bem como esses aparelhos podem fazer mal a uma pessoa.

 

"Pergaminho do Dragão" e tela do smartphone (Montagem: Futbox)

“Pergaminho do Dragão” e tela do smartphone (Montagem: Futbox)

 

Países como Finlândia, Itália, Suíça, Países Baixos e México anunciaram recentemente a proibição dos celulares em sala de aula. Em alguns estados/regiões de outros países como Estados Unidos, Portugal, Escócia e Canadá, o uso de celulares também foi banido, total ou parcialmente. (Mais detalhes aqui).

 

Capturar informação ao invés de gerar conhecimento

 

A inteligência artificial irá diminuir drasticamente a capacidade de interpretação de texto do ser humano, sua autocrítica e, principalmente, sua capacidade de questionar as coisas. É verdade que ela exercita a formulação de perguntas, muito mais importante do que encontrar respostas em segundos (utilizo periodicamente uma dessas ferramentas, mas como ponto de partida e não, linha de chegada), e também, irá propiciar avanços significativos na medicina, ciência, alimentação e infraestrutura, mas só até a página 2. Quando as redes sociais surgiram, tinham o propósito “oficial” de aproximar pessoas, entretanto, rapidamente se tornaram ambientes de manipulação e falseamento da realidade.

O nosso sistema financeiro contemporâneo precisa que hajam problemas sociais, pobres, exploração de trabalhadores e eternas demandas psíquicas para se sustentar, ainda mais agora com o termo do ano em 2024, segundo a Universidade de Oxford: “brain rot”, que nada mais é do que a sensação do “cérebro apodrecido” atrelada à sobrecarga de informações digitais, causando dificuldade de concentração, redução da produtividade, maior agitação, quadros de ansiedade e depressão.

A inteligência artificial, que não é “inteligência” e muito menos “artificial”, pode se tornar uma ferramenta/ambiente onde jovens e adultos, fascinados com a possibilidade de criarem coisas sem ter talento algum ou dedicarem esforço para tal, irão acreditar que são os agentes da transformação, quando na verdade, são robôs trabalhando de graça, mais uma vez, para gigantes corporativos.

Plataformas essas que capturam diariamente, há mais de uma década, todas as nossas informações pessoais, comportamentos e desejos, comercializando todo esse “acervo” com outras grandes marcas e empresas, que por sua vez, nos vendem produtos a partir desses preciosos relatórios ou nos oferecem serviços “gratuitos”, quando na verdade, somos revendidos.

Um círculo vicioso sem fim, envelopado numa sensação de que não pagamos pelo que usamos digitalmente ou se preferir, ratos de laboratórios buscando recompensas que se esvaziam rapidamente. O aprendizado, de fato, por meio da AI ficará restrito às grandes corporações, englobando poucos profissionais nas áreas já citadas, além de programadores, analistas e curiosos.

Por enquanto, para a sociedade em geral, apenas a sensação de atalho para solucionar dificuldades e desafios no dia a dia.

 

Arte capa: FUTBOX

 

 

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Adriano Ávila

A prova inquestionável que existe vida inteligente fora da Terra é que eles nunca tentaram contato com a gente.

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